terça-feira, 22 de outubro de 2013

E agora, ao cair da noite, mais a sério

Foi na passada sexta feira que o país acordou atordoado pela notícia de que há quem ache que o Tribunal Constitucional tem lá dentro marionetas, que a Constituição da República é uma lei perfeita para ser ambígua e que os acórdãos em que não se diga Amen ao governo são, nada mais, nada menos, que expressões de como as pessoas do mal podem, querendo, ser forças de bloqueio. Gosto sobretudo da expressão "forças de bloqueio", como se o governo quisesse levar-nos para algum lado decente e o TC andasse a prendê-lo por uma perna. Gosto também muito da ideia bacoca de que somos todos uma cambada de atrasados mentais (sem ofensa para os atrasados mentais) que achamos normal ouvir e calar quando, assim de repente, se lembram que bom, mesmo bom, era arrasar com o princípio da separação de poderes ou, melhor ainda, subsumir a legislatura e a jurisprudência à deriva dos artolas que teimam em achar que governar é mandar nisto. O governo está para o país como os pais para os filhos a quem não dão cavaco (palavra curiosa no contexto) ou como os maridos para as mulheres a quem perguntam opinião, já de mão em riste acaso lhes ocorra dá-la. A bem dizer, eu cá até acho que há pouco mais a fazer num país que, de facto, "nem se governa, nem se deixa governar", portanto, eu nem me irrito com as medidas (com algumas irrito, mas pronto, adiante), mas sim com o ar de virgens ofendidas que a escumalha de governantes faz quando nos fode reiteradamente e a maus modos. O pormenor de luxo, porém, estava para chegar pela boca do Zé (há cada vez mais Zés nestas histórias), que se lembrou que bom, mesmo, era o TC aproveitar a experiência dos juízes sociais e chamar a malta para decidir com ele. Tenho sempre medo de juízes sociais. Acho que é uma lotaria serem bons e tenho a certeza que se há coisa em que não convêm lotarias é na aplicação da justiça. Esta ideia, porém, não bebendo do rigor técnico que agora lhe imprimo porque o Zé, em verdade, deve perceber tanto de colectivos e juízes sociais como eu de lagares de azeite, tem um pequenino senão: não tem pés nem cabeça. Só almas iluminadas pelo "venha a mim" podiam lembrar-se de coisa tão peregrina. E eu cá juro que se fosse conselheira teria hesitado muito, sem saber se havia de me rir ou de chorar por me respeitarem tanto como às rodas do carro do Padre, que até andam pelo chão. E é assim que vai o meu país. Cheio de pobreza, mais que muita em todo o lado e um tudo nada ainda superior no espírito de meia dúzia que, por azar dos azares, calham de falar e ser ouvidos.

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